sexta-feira, 20 de maio de 2011

A sugestão de leitura que faço é de obra tão clássica quanto atual. “O Alienista”, de Machado de Assis, permite aproximação, por via transversa, com o tema da criminalidade, ao passo que oportuniza o contato com trabalho de invulgar qualidade daquele que é, para muitos, o maior escritor brasileiro.
Em breve resumo, o conto, que inaugura a fase realista do romance brasileiro, relata a história de Simão Bacamarte, médico que goza de respeitável prestígio na Europa e que se instala na pacata Itaguaí, onde inaugura sua “Casa Verde” (hospício). Para levar a efeito suas pesquisas, começa a internar verdadeiras cobaias humanas, de acordo com os mais variados tipos de personalidade.
Aos poucos, a população de Itaguaí foi sendo internada, e os que estavam de fora, aplaudiam a iniciativa do alienista. Entretanto, quando mais de oitenta por cento da população estava internada, Simão Bacamarte começa a repensar seus critérios de internação, de sorte que os inverte. Passa a manter na Casa Verde os sãos (simples, leais, sinceros). De forma mais rigorosa, percebe que o único sadio é o próprio alienista, razão pela qual se internou no casarão, onde morreu, só, dezessete anos depois.
A política criminal contemporânea passa por uma severa tendência neopunitivista. Os programas televisivos do fim da tarde evidenciam a necessidade de encarceramento. O discurso da impunidade toma conta dos noticiários, ao passo em que o ‘país da impunidade’ nunca antes teve presídios tão superlotados.
Ao passo em que se instiga a criminalização de determinadas condutas, e maior rigor no tratamento penal de outras tantas (especialmente as que atingem bens jurídicos pertencentes às classes mais elevadas), os mesmos que reivindicam exigem do sistema penal tratamento diferenciado. Não querem punição à download de músicas pela internet; não querem se sujeitar a bafômetro em blitz de trânsito; e não vêem problema em uma “sonegadinha” de Imposto de Renda.
O sistema penal – assim como a cruzada manicomial de Simão Bacamarte – não entrega aquilo que vende (proteção de bens jurídicos). É mecanismo de controle de poder da classe dominante sobre a classe dominada, mas isto é assunto para outra conversa, em especial na cadeira optativa de Criminologia.

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