sexta-feira, 18 de junho de 2010

Boletim IBCCRIM Junho/2010:Editorial

Quando o extermínio é uma política de Estado que responde pelo nome de segurança pública

Nas últimas semanas tem vindo a público uma sequência de episódios de acentuada violência envolvendo policiais militares na prática de tortura e espancamentos a civis, do que em diferentes momentos tem resultado a morte de alguns motoboys que, além da profissão, ostentavam em comum o fato de serem jovens, negros e pardos, e não se encontravam, no momento da abordagem e da violência policial, envolvidos em qualquer ocorrência criminosa. Após a divulgação dos fatos pelos meios de comunicação, o comando da PM e autoridades públicas, diante da incontestável barbárie promovida por seus agentes, apressaram-se em classificá-la como ilegal, um "excesso" a ser corrigido. Uma breve análise das estatísticas sobre a letalidade da ação policial, que seriam divulgadas ironicamente no mesmo período, revelaria, contudo, que a violência letal contra civis está longe de se apresentar como uma exceção no sistema de segurança pública paulista.

O primeiro trimestre de 2010 registrou um aumento de 40% nas mortes promovidas pela PM em comparação com igual trimestre de 2009, saltando de 104 – um número já elevado – para 146 mortes. Aumento ainda maior, de 56%, havia sido registrado no último trimestre de 2009, já sob nova gestão da Secretaria de Segurança, que assumira em março daquele ano com um forte discurso incitando as forças policiais ao confronto, reclamando o famoso jargão "ROTA nas ruas" e classificando como hipócritas as ações "politicamente corretas em matéria de segurança pública"(1).

A altíssima letalidade da ação policial nos grandes centros brasileiros está longe de ser uma novidade na política de segurança pública adotada no país, mesmo no período pós-democrático. O recente relatório elaborado pela Human Rights Watch – sobre as execuções sumárias no Rio de Janeiro e em São Paulo – pôde traçar um retrato da magnitude da força letal do Estado repressivo brasileiro. Quer sob o forjado "confronto" que se expressa pela categoria extrajurídica "resistência seguida de morte", quer por manifestações mais deliberadas de execução de civis por grupos de extermínio e, mais recentemente, por atos de "encapuzados", as polícias desses dois Estados mataram 11.000 pessoas entre os anos 2003 e 2009. Se tomarmos apenas as mortes justificadas em São Paulo sob a rubrica "resistência seguida de morte", chegam a 2.176, número superior às mortes promovidas pela polícia da África do Sul (1.623), país com taxas de homicídio superiores às do Estado de São Paulo(2).

Não é difícil notar que se está diante de uma deliberada política de extermínio voltada a segmentos muito determinados da população: jovens do sexo masculino, afrodescendentes e habitantes das periferias e favelas dos centros urbanos. Por outro lado, não parece crível tratar-se de um cenário de guerra civil ou conflito armado, como se tem argumentado, pois tal realidade faria supor, primeiro, proporção igual nas mortes, ou seja, "baixas", nas duas frentes em conflito, e em segundo lugar um número grande de só feridos. Aqui a realidade é contrastantemente outra. O número de policiais mortos em suposto confronto é bem menor se comparado ao de civis – em SP, nos últimos 12 meses, foram 18 PMs mortos em serviço. Ainda em São Paulo, entre os anos de 2004 e 2008, grupos das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (ROTA) mataram 305 civis e deixaram somente 20 feridos. Nesse período, um único óbito de policial da ROTA foi registrado.

Embora pese uma tradição demasiadamente autoritária em matéria de segurança pública em nosso país, e os resquícios de um recente passado ditatorial ainda estejam muito vivazes na consciência e no imaginário social, a história tem mostrado que depende sobremaneira da orientação adotada pelos governantes, para que a política de segurança se mostre mais ou menos democrática ou mais ou menos violenta. Durante o governo Mário Covas (1994-2000), por exemplo, uma série de iniciativas tomadas com o objetivo de reduzir a violência policial e tornar as polícias mais democráticas, resultou efetivamente numa diminuição da letalidade policial e em avanços como a criação da Ouvidoria da Polícia. Lamentavelmente os governos que o sucederam e seus respectivos gestores não apenas abandonaram tais objetivos como, sob o argumento de feroz enfrentamento à criminalidade, impulsionaram a ação violenta de suas polícias, resultando nos bárbaros índices apresentados.

Não nos iludamos: não é possível associar a truculência à eficiência e honestidade, argumento hoje fortemente mobilizado para exaltar a orientação que tem sido predominante em matéria de segurança pública. Esse foi o mesmo argumento insistentemente usado durante a ditadura militar para legitimar a violência e o autoritarismo das forças repressivas da época, sob o pretexto de também oferecer às pessoas de bem, em contrapartida, a quimera da segurança e da tranquilidade. O que a truculência e o arbítrio escondem é justamente o desvio, a possibilidade permanente da corrupção; afinal como alguém não se corromper diante do fato de se lhe ter conferido o mais absoluto dos poderes, a decisão sobre a vida e a morte?

Não é, assim, à modernização da segurança pública que temos assistido, diferentemente do que alguns analistas e muitos administradores públicos têm ufanado. Não há nada mais antimoderno na polícia de um Estado, que se pretenda democrático, do que retirar sumariamente vidas de civis em proporções assustadoras. Investir pesadamente em ações de caráter ostensivamente militar e ao arrepio da lei, como operações de ocupação em favelas, tampouco traz a marca da "modernização". Uma política de segurança pública, que se pretenda moderna e ao mesmo tempo democrática e eficaz, deve investir numa polícia científica, bem preparada, orientada a técnicas investigativas e à produção de provas legais, garantindo os direitos dos cidadãos, e, em situações de repressão e confronto, ter como recurso último, e sempre combatível, a força letal. Estamos muitíssimo longe de uma política desse quilate e – talvez o que é ainda pior – estamos caminhando, a cada dia, mais decisivamente no sentido contrário.

Notas

(1) Cresce o número de pessoas mortas pela PM. Folha de S. Paulo, 5 de maio de 2010.
(2) Human Rights Watch. Força Letal: Violência Policial e Segurança Pública no Rio de Janeiro e em São Paulo, 2009. Disponível em http://www.ibccrim.org.br/upload/le_force.pdf.

FONTE: Quando o extermínio é uma política de estado que responde pelo nome de segurança pública. In Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 18, n. 211, p. 01-02, jun., 2010.

domingo, 13 de junho de 2010

Em um canal de esporte qualquer...

Apresentador: Os assaltantes dos jornalistas espanhóis e portugueses, na África, foram identificados, presos, julgados e condenados a 15 anos de prisão, em três dias.
Apresentadora: Rápida a justiça africana, né?
Apresentador: É
Cai o pano!

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Luto

Chocado com as recentes notícias do final desta triste sexta-feira, que dão conta da trágica morte do professor, advogado, colega e amigo Ivan Guardati Vieira, alguns pensamentos afluem em sua memória.

Professor amado por seus alunos de Direito Processual Penal (UNISINOS), combativo advogado criminalista, pessoa singular, Ivan nos deixa muito cedo. Dono de uma gargalhada cativante, Ivan era uma pessoa extremamente agradável.

Almocei com Ivan, há cerca de 20 dias, depois de uma audiência, junto com alguns outros amigos, a pretexto de discutirmos o processo. Fizemos de tudo, menos trabalho. Porque mesa de reuniões, com Ivan, sempre era mesa de bar.

Ao final de uma dessas audiências, aqui em Santa Maria, no ano passado, fomos jantar no Augusto. Após alguns vários chopp's, estendemos ao Zeppelin, bar que 'fechamos' às 3 da manhã. Ainda era cedo para nossas conversas, e risadas. Amanhacemos na minha casa, com mais alguns amigos, após algumas gargalhadas e um litro de whisky.

Nessa noite, Ivan contou a história, de que em dias de provas, na Unisinos, levava um ralador de cozinha à sala de aula, e dizia que ele não ralava ninguém. Quem se ralava, mesmo, eram os próprios alunos. Assim, ele firmaria o ralador, para que os alunos se esfregassem.

Vai com Deus, Ivan. Entre nós fica tua marcante passagem.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Encontro de hoje...

Pessoal,
Os links do Outsiders foram todos revisados e estão funcionando.
Tenho audiência às 18h30. Devo chegar um pouco atrasado no grupo. Comecem sem mim, que chego a tempo.
Abraços e até lá.

sábado, 5 de junho de 2010

Hino ao Tabaco - Júlio Dinis

No centro dos círculos De nuvens de fumo, Um deus me presumo,
Um deus sobre o altar! Nem doutros turíbulos
Me apraz tanto o incenso Como o deste imenso Cachimbo exemplar!

Em divas esplêndidos, Cruzadas as pernas, Fuma, horas eternas.
O ardente sultão Subindo-lhe ao cérebro O mágico aroma, Esquece Mafoma,
Houris e Alcorão.

Longe, oh! longe o ópio, Que os sonhos deleita
Da mísera seita
Dos Theriakis!
Horror ao narcótico
Que vem das papoulas!
E ao que arde em caçoulas
No altar de Caciz!


Que a raça gentílica Das zonas ardentes Consuma as sementes Do arábio café.
Despejem-se as chávenas
Da atroz beberagem
Da cor do selvagem
Da adusta Guiné.

E a tal folha exótica, Delícias da China, Por nossa má sina Trazida de lá,
Servida em família
Num morno hidro-infuso?... Anátema ao uso
Das folhas do chá!

Nem tu, ó alcoólico Humor dos lagares, Terás meus cantares, Meus hinos terás, Embora das ânforas, Vazado nas taças,
Aos outros tu faças, A língua loquaz.

Cerveja britânica, De furor espuma? De coisa nenhuma Me podes servir.
Quando oiço do lúpulo
Gabarem proezas
Às boas inglesas,
Desato-me a rir.

Nem venha da cânfora
Pregar maravilhas
O das cigarrilhas
Famoso inventor.
Raspail é cismático
E eu sou ortodoxo
O seu paradoxo
Não me há-de ele impor.


Meu canto é da América, País do tabaco,
Perante o qual Baco
Seu ceptro partiu.
A Europa, Ásia e África
E a Terra hoje toda
Este herói da moda
De fumo cobriu.

Até na Lapónia
Da gente pequena,
Se fuma; e no Sena,
No Tibre e no Pó,
No Volga e no Vístula,
No Tejo e no Douro;
Que imenso tesouro
Se deve a Nicot!

Meus áridos lábios
Mais fumo inda aspirem;
Que os parvos suspirem
Por beijos aos mil.
Não quero outros ósculos,
Não quero outra amante..
Qual mais doudejante
Que o fumo subtil?

Tornadas Vesúvios, As bocas fumegam
De nuvens que cegam Vomitam montões. Fumar! Oh delícias! Prazer de nababo!
E leve o Diabo
Do mundo as paixões.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Canção de Outono - Cecília Meirelles

Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o própro coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando áqueles
que não se levantarão...

Tu és a folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

Botequim - Encontro do dia 1º de Junho



Mais algumas arestas aparadas, e, aparentemente, estamos mais do que prontos para iniciar efetivamente os trabalhos do Grupo, na terça-feira que vem. O intervalo de 15 dias do lançamento da idéia aos primeiros trabalhos, penso, foi fundamental para que desse tempo de lermos os textos, e, antes de apresentá-los, discutirmos sobre a leitura, no encontro da última terça.


Algumas mudanças de rumos. As apresentações serão semanais, para não perdermos o pique. Os demais capítulos do Outsiders já estão divididos, e até o final de junho, as apresentações serão concluídas. Em julho, "Meu Vizinho é um Psicopata", a pedido da Fernandinha.




terça-feira, 1 de junho de 2010

Judiciário gasta R$ 2,6 mil para julgar tentativa de furto de R$ 5,89

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a extinção de uma ação penal contra uma mulher condenada pela tentativa de furto de três vidros de esmalte, avaliados em R$ 5,89. De acordo com a Quinta Turma, trata-se do chamado “crime de bagatela”, tendo em vista o pequeno valor, que não lesionaria o patrimônio da vítima e não causaria qualquer consequência danosa.

São correntes os casos que chegam ao STJ em que vem sendo aplicado o princípio da insignificância. Bens cujos valores são ínfimos se comparados ao custo médio registrado para cada processo julgado no Tribunal no ano passado: R$ 2.674,24. No Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta corte do país, o custo médio do processo em 2009 foi de R$ 3.775,06.

No início de fevereiro, a Quinta Turma concedeu habeas corpus a um homem que furtou um caderno em uma papelaria. Outras situações semelhantes que acabaram chegando ao Tribunal Superior se tornaram folclóricas, como os furtos de um boné, de um pote de manteiga, de um cabrito, de uma bicicleta, de galinhas e de frangos congelados. Todos analisados pelo STJ e considerados crimes de bagatela.

No caso julgado recentemente, a Defensoria Pública de Minas Gerais recorreu ao STJ depois que o Tribunal estadual manteve a condenação a seis meses de reclusão pela tentativa de furto. De acordo com o Tribunal local, as condições pessoais da condenada impediriam a aplicação do princípio da insignificância.

O relator, ministro Arnaldo Esteves Lima, afirmou que, embora o ato seja considerado furto, é desproporcional a imposição da pena. Para o ministro, a ofensa foi mínima, não houve perigo social na ação e a reprovação pelo comportamento é mínima. “A conduta não possui relevância jurídica”, afirmou. O ministro também salientou que a lesão ao patrimônio da vítima foi inexpressiva, não se justificando a intervenção do direito penal.


Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ